quinta-feira, 9 de setembro de 2010

Uma dúzia de ovos por US$ 8, um papo com Michael Pollan

Na semana passada li uma ótima entrevista do Michael Pollan sobre a matemática de comprar produtos locais e resolvi traduzí-la para o português. Pollan fala sobre a compra de alimentos no dia a dia, sobre procurar comer produtos da estação e também sobre porque o pagar mais por alimentos de qualidade faz sentido economicamente. Para quem não sabe, Pollan é americano, morador de São Francisco Bay na Califórnia e autor, entre outros livros, do best seller "O Dilema do Omnivoro". Ele se tornou um dos líderes intelectuais da idéia de comprar produtos sazonais e produzidos localmente por produtores rurais.

O artigo original foi escrito por Ben Worthen e publicado no Wall Street Journal;
http://online.wsj.com/article/SB10001424052748704271804575405521469248574.html?mod=WSJ_hps_MIDDLEFifthNews

Hoje em dia já temos certeza que os alimentos produzidos localmente - sem o uso de defensivos nem fertilizantes químicos - são mais saudáveis para nós e são melhores para o meio ambiente; no entanto, muitas vezes eles são muito caros. Pollan explica que o verdadeiro problema na nossa cadeia alimentar mundial é o fato dos subsídios econômicos manterem os preços de alimentos produzidos em larga escala artificialmente baixos. Esses alimentos mega industrializados não apresentam benefícios reais nem são produtos “elegantes”, pois possuem em quase todos os casos, ingredientes que não conseguimos identificar como comestíveis, ao mesmo tempo em que apresentam resíduos sensoriais desagradáveis. Ainda assim, Pollan tenta encontrar um meio termo entre o idealista e o realista e na sua sala de estar em Berkeley, ele conversa sobre onde compra atualmente seus alimentos e porque vale a pena pagar US$ 8 (R$ 14) por uma dúzia de ovos.

•••> Michael Pollan em seu jardim na sua casa em Berkeley, 2007. |zuma press

WALL STREET JOURNAL: Você acha que os residentes da costa da Califórnia compram alimentos de uma maneira diferenciada de outros lugares no mundo?
MICHAEL POLLAN: Acredito que a costa oeste dos Estados Unidos foi um dos lugares aonde se iniciou o processo de conscientização sobre a compra de alimentos de qualidade. Existe aqui um nível muito mais elevado de consciência sobre a origem dos alimentos, sobre comer sazonalmente e localmente, do que no resto do país. Temos certas vantagens em relação a outros lugares do país, pois podemos comer alimentos comprados em feiras de produtos frescos e nos mercados produtores durante 50 semanas do ano.


Como você vê o entusiasmo contribuindo para comermos melhor?

É uma questão de consciência e de paladar que tem sido constantemente educado e promovido pelos chefs locais, demonstrando que vale a pena pagar, por exemplo, US$ 3,90 (R$ 6,8) por um pêssego da variedade Frog Hollow cultivado de maneira orgânica. Eu conheço muita gente aqui disposta a pagar esse preço. Não sei se você pode encontrar um pêssego mais caro nos Estados Unidos. Minha simples regra "pagar mais, comer menos" é seguida por centenas de pessoas na Califórnia e no mundo.


Aonde você compra seus alimentos ?

Eu compro alimentos no mercado produtor perto da minha casa nas quintas feiras, no mercado de Monterey e também no centro Berkeley Bowl. Os produtos de limpeza, cereais e outras coisas para a casa, eu compro no supermercado Safeway.


Como você sugere que pessoas em Nova York ou em outros lugares com um longo inverno comam sazonalmente?
Na maior parte do país, comer sazonalmente durante o inverno é um desafio. Existem, no entanto, opções que as pessoas esquecem. Uma salada de raízes de legumes e de verduras, por exemplo, poderia ser uma alternativa refrescante para substituir a alface - além de ser muito mais nutritivo também. Mas na verdade tudo depende da intenção, de como se lida com o assunto. Não acredito em extremismos.


Você se preocupa em comprar produtos específicos em determinados lugares?

Sou bastante flexível, não sou um fanático, apesar de que algumas pessoas pensam. Eu já contei histórias sobre ser flagrado comprando cereais açucarados quando meu filho era pequeno.


Existem regras sobre compras que podem ser seguidas por pessoas interessadas em comer bem?

O mais importante é tentar sempre comprar produtos que sejam produtos da estação. É importante ignorar os alimentos até que os mesmos estejam em temporada, porque estarão muito melhores, mais gostosos e mais baratos. É maravilhoso quando encontramos tomates, morangos ou espargos maduros, lindos e com indicação de origem nos esperando no mercado.


Comer alimentos produzidos localmente de maneira sustentável precisa ser uma prioridade ou pode-se fazer isso de maneira casual?

Acredito que de maneira casual, sem dúvida. Há quem vá ao mercado produtor todas as semanas e há pessoas que vão somente algumas poucas vezes por ano. Para comer bem realmente leva-se um pouco mais de tempo, esforço e dinheiro. Mas o mesmo acontece para ter acesso a boa leitura, ou para assistir a um bom programa de televisão ou para comprar um vestido. Fazer qualquer coisa com atenção à qualidade requer esforço. Ou a experiência é recompensadora para você ou não é. Para mim esse esforço é fundamental. De certa maneira, eu entendo as pessoas que não se preocupam com qualidade e que nao se importam com esforços.


Comer bem é apenas uma indulgencia para pessoas que podem pagar mais por isso?
Se você estiver no supermercado comprando produtos orgânicos, você vai gastar mais do que se comprasse produtos convencionais. Mas comprar alimentos no mercado produtor, comparando com produtos oferecidos no supermercado e que estão em temporada, na mesma época, você na verdade vai pagar menos. As pessoas nao deviam tirar conclusões sem sentido sobre os preços de produtos de qualidade.

O que você gostaria que as pessoas, ao ler esta entrevista, entendessem sobre os alimentos que ainda não entendem?
Nós fomos condicionados por uma comunicação que estimulava a compra de alimentos baratos, artificiais, produzidos como se fossem latas de tintas ou sapatos chineses, ao mesmo tempo que éramos induzidos a ficar chocados quando uma caixa de morangos custasse US$ 3 (R$ 5,4) no ponto de venda.

Acho muito importante sabermos todos que os agricultores não estão ficando ricos. Quando
encontramos morangos sendo vendidos a US$ 1 (R$ 1,7) a caixa, somos levados a concluir que o processo de trabalho foi realizado com produtos químicos - na sua grande maioria com derivados de petróleo - para que nao fosse necessária a utilização de mão de obra no campo.

US$ 8 (R$ 14) por uma dúzia de ovos pode parecer loucura, mas quando você percebe que
pode-se preparar uma deliciosa refeição com apenas dois ovos - são somente cerca de US$ 1,50 (R$ 2,7). Não é muito se pensarmos realmente como desperdiçamos dinheiro em nossas vidas.




http://online.wsj.com/article/SB10001424052748704271804575405521469248574.html?mod=
WSJ_hps_MIDDLEFifthNews
http://michaelpollan.com/books/

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