Meu primeiro contato profissional com o mundo da agricultura, colheita e produção do azeite de oliva extra-virgem foi em 2002. Tudo começou em Nova York, quando ainda estudava na New York University e trabalhava para revista La Cucina Italiana, no escritório americano da editora Quadratum de Milão, donos do título. Esta é a mais antiga publicação de gastronomia do mundo.
Fui convidado para uma reunião onde Paolo Villoresi - então editor-chefe da revista e grande gastrônomo italiano - perguntou se eu gostaria de trabalhar com pequenos produtores de azeites da Itália. Além de uma matéria especial na revista, estavam planejando criar um mecanismo de relação direta entre os leitores da (cerca de 500 mil, naquela época) e os produtores de azeite Italianos.
A sugestão seria um clube de azeites para os assinantes. Tudo aconteceu muito rápido e, em algumas semanas, estava a caminho de Florença, na Itália. Minha primeira food trip, ou viagem gastronômica, foi na região chamada Greve in Chianti.
Em quase quatro anos trabalhando com o clube e a promoção de azeites italianos nos EUA, encontrei figuras ilustres. Entre elas, Alberto Galluffo, um dos principais especialistas em azeites da Sicilia, e Manfredi Barbera. Aliás, fui algumas vezes durante a colheita visitar o lindo terroir de Manfredi, na pequena cidade San Lorenzo ai Colli, perto de Palermo. Manfredi faz parte da sexta geração de uma família produtores de azeite.
Tive a oportunidade de trabalhar durante alguns anos com Paolo Villoresi. É um Toscano, de boa boca, fascinado por culinária desde à infância, escritor de livros premiados sobre azeites e presidente do Instituto de Culinária Italiano, em Nova York. Villoresi tambem é membro da Accademia della Cucina Italiana. Ele foi o meu primeiro mestre com quem aprendi a degustar, diferenciar notas sensoriais e entender mais sobre variedades de azeitonas, que crescem em diversas partes do mundo.
A cada mês, selecionávamos um azeite de uma região italiana. A única regra na seleção era ter a certeza de que o produto não estaria no mercado americano. Os EUA são os maiores consumidores de azeites do mundo e a competição de marcas, origens e qualidades já era complicada em 2002/2003. Então, tínhamos um programa super exclusivo, com matéria-prima única, jamais antes disponíveis em outro continente. Da mesma forma, os produtores eram únicos.
Enzo Notaristefano, um excelente produtor de azeite do vilarejo de Contrada Casalrotto - parte da cidade de Mottola, em Puglia (pronuncia-se Pulhia) - sempre me contava as histórias da família e o poder da região em relação ao azeite no passado. A Puglia é a maior região produtora da Itália.
Durante dois anos, trabalhei com Luigi Catalano, na pequena cidade de Viterbo, a 50km de Roma e perto do Monte Cimini. Luigi pertence à quarta geração de produtores. Orgulloso de sua herança etrusca, Luigi sempre ficava feliz em mostrar seus 8 hectares de oliveiras com Canino, Leccino e Frantoio plantadas, segundo ele, desde o final do século 18.
Na região da Liguria tive a oportunidade de selecionar ótimos azeites. Nessa área da Itália a monocultura da variedade de oliva Taggiasca é impressionante. Alguns moinhos da região foram construídos em 1780. Na província de Imperia conheci Laura Marvaldi, no vilarejo de Borgomaro, localizado no Vale del Maro. Em Gênova, no ano de 2004, conheci o amigo Gianluca Petrelli, produtor do azeite Costa dei Rosmarini.
Na cidade de Piceno, na região de Marche, conheci duas novas variedades de oliva: Carboncella e L’Ascolana. Segundo Mauro Antonioni, produtor do Gemina D’Oro, os romanos gostavam muito da L’Ascolana por seu sabor doce e sua capacidade de abrir o apetite. São muitos outros produtores em muitas outras regiões italianas.
Espero contar todas as histórias em um livro no futuro. Mas não poderia deixar de falar sobre uma das experiências mais sensacionais que já tive em 10 anos de gastronomia. Nos pés do Monte Iblei - no sul da ilha da Sicilia, perto da cidade de Ragusa, chegando em Buccheri -, encontrei Angelo Lucifora da Azienda Agrícola Tumino Emanuela. Acho que, por um lado, o terroir de Iblei e os azeites feitos com a variedade de oliva Tonda Iblea são incomparáveis. Mas do outro, Angelo representa o que a Europa ainda tem de mais puro e tradicional. Artesãos do sabor, camponeses humildes que dedicam todos os dias do ano ao cultivo, com sabedoria agrícola que são passadas de geração a geração. Precisamos promover e preservar.
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Paulo A Lima é gastrônomo profissional, carioca e um dos diretores do projeto LA Organic, em Madrid